💸 Brasileiros voltam a se afundar em dívidas: 27% da renda já vai para bancos, o maior nível desde o Desenrola

Alta da Selic, inflação persistente e crédito caro empurram famílias para empréstimos mais arriscados; nova linha de consignado tenta conter escalada

O alívio promovido pelo programa Desenrola ficou para trás. Em fevereiro de 2025, último dado disponível do Banco Central, o comprometimento da renda das famílias com dívidas voltou a subir e atingiu 27,2% — o maior patamar desde julho de 2023 (27,3%), justamente quando o programa federal de renegociação foi lançado. A trajetória de alta se intensificou a partir de dezembro do ano passado.

Segundo especialistas, a piora tem múltiplas causas: crescimento na tomada de crédito, disparada da taxa básica de juros (Selic) — que saltou de 10,5% para 14,75% ao ano em 12 meses — e inflação ainda acima da meta. O cenário pressiona especialmente famílias de baixa renda, que acabam recorrendo a linhas de crédito mais caras, como rotativo do cartão e cheque especial.

Dívida cara vira rotina

A aposentada Maria Regina Cordeiro, de 72 anos, é um retrato da dificuldade: viúva, ela vive em São João de Meriti (RJ) com a filha autônoma e paga R$ 2.800 mensais em dívidas, usando praticamente toda sua renda fixa (aposentadoria e pensão do marido somam pouco mais de R$ 3 mil).

— Está tudo caro demais. Gás, água, alimentação. Meus dois salários mínimos vão quase todos para pagar dívida — conta ela, que tenta evitar o cheque especial, cujos juros beiram os 130% ao ano.

Em Piedade, na Zona Norte do Rio, a copeira hospitalar Alexandra Gonçalves, de 49 anos, viu a dívida familiar explodir após um empréstimo consignado de R$ 14 mil feito em nome da neta, que recebe o BPC. Com um orçamento mensal de R$ 5.700, quase R$ 3 mil vão para aluguel, alimentação, plano de saúde da neta com autismo e prestações do crédito.

— Tem mês que a gente aperta daqui para cobrir dali — resume.

Juros altos e inflação pressionam

A escalada do endividamento ocorre em um contexto de política monetária contracionista. O Banco Central elevou a Selic para conter a inflação, que, embora em desaceleração, acumulava 5,53% em 12 meses até abril — acima da margem de tolerância da meta de 3%.

O economista Caio Napoleão, da MCM 4intelligence, explica que o Desenrola teve impacto positivo em 2023 e 2024, com o comprometimento da renda caindo para 25,8% em maio passado. Mas desde então, o alívio se esvaiu. “Cerca de 70% do crescimento recente da dívida vem da amortização do principal. Ou seja, as famílias estão tomando mais crédito, especialmente pessoal, cartão e financiamento de veículos”, afirma.

Embora a renda tenha crescido 9,5% entre maio de 2024 e fevereiro deste ano, o aumento da dívida foi ainda maior, impulsionado pelos juros elevados.

Novo consignado tenta conter crise

Para tentar evitar um agravamento da crise, o governo aposta agora no Crédito do Trabalhador, que estendeu o acesso ao empréstimo consignado para todos os empregados com carteira assinada — mais de 40 milhões de pessoas. Em pouco mais de um mês, R$ 10,1 bilhões foram concedidos, sendo R$ 2 bilhões destinados à migração de dívidas mais caras.

Segundo Isabela Tavares, da Tendências Consultoria, a medida pode ajudar a “trocar dívidas ruins por dívidas melhores”, com juros mais baixos e prazos mais longos. Ela acredita que o novo modelo é uma mudança estrutural no mercado de crédito:
— O consignado já ultrapassa, em volume, o do INSS. É um movimento surpreendente.

Governo cobra ‘cidadania financeira’

Além do crédito mais barato, a equipe econômica quer reforçar a proteção ao consumidor de serviços financeiros, promovendo o que chama de “cidadania financeira”. O secretário de Reformas Econômicas, Marcos Pinto, defende que os bancos ajam com mais responsabilidade ao oferecer crédito:

— Nos países desenvolvidos, como EUA e Reino Unido, há obrigações para que instituições avaliem a capacidade de pagamento dos clientes. O Brasil ainda precisa avançar nisso.

O Banco Central afirma que está ampliando a supervisão sobre o setor bancário e cita medidas como a limitação dos juros do rotativo e do cheque especial. Uma proposta de reorganização regulatória — com foco em proteção ao consumidor — é prioridade do Ministério da Fazenda em 2025, mas ainda está em formulação.

📊 Endividamento das Famílias Brasileiras em Alta

💸 Comprometimento da Renda

  • 27,2% da renda das famílias vai para dívidas (fev/2025)
  • Maior patamar desde jul/2023, início do Desenrola

📈 Por que a dívida aumentou?

  • 📌 Mais empréstimos no 2º semestre de 2024
  • 📌 Alta da Selic: de 10,5% → 14,75% ao ano
  • 📌 Inflação acumulada: 5,53% (12 meses)
  • 📌 Mais uso de crédito caro: rotativo, cheque especial, crédito pessoal

👩‍🦳 Histórias reais

Maria Regina (72 anos)
🧾 R$ 2.800 de dívidas mensais
👵 Vive com a filha autônoma na Baixada Fluminense
🗨️ “Meus dois salários mínimos vão quase todos para pagar dívida”

Alexandra (49 anos)
👩‍👧 R$ 3 mil/mês em dívidas e despesas com neta com autismo
🗨️ “Tem mês que a gente aperta daqui para cobrir dali”


🆘 Desenrola ajudou, mas efeito passou

  • Queda até mai/2024 (25,8%), mas dívida voltou a subir
  • Nova pressão vem de juros altos e novos créditos tomados

💼 Soluções em curso

✅ Crédito do Trabalhador

  • Ampliação do consignado para 40 milhões com carteira assinada
  • Já emprestou R$ 10,1 bilhões
  • R$ 2 bilhões usados para quitar dívidas mais caras

🛡️ Cidadania Financeira

  • Governo e BC querem educação financeira e mais proteção ao consumidor
  • Nova regulação em estudo para bancos oferecerem crédito mais responsável

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