Correios dobram prejuízo, atrasam pagamentos e viram foco de crise no governo Lula
Falta de materiais, dívidas milionárias e auditoria do TCU agravam situação da estatal, que perdeu receita com a “taxação das blusinhas” e enfrenta fuga de clientes

A situação dos Correios se deteriorou nos últimos anos e a estatal virou foco de preocupação dentro do governo federal. Com prejuízo dobrado em 2023, queda contínua na receita, atraso nos repasses a fornecedores e até falta de itens básicos como fita adesiva e papelão, a empresa pública enfrenta sua pior crise em mais de uma década.
Sob o comando de Fabiano Silva dos Santos, ligado ao grupo de advogados Prerrogativas, próximo ao presidente Lula, os Correios operam no vermelho desde 2022 e perderam competitividade no mercado de entregas diante de empresas privadas mais ágeis.
Em meio ao colapso operacional, trabalhadores relatam atrasos salariais, agências sucateadas e escassez de materiais de trabalho. “Falta manga [papelão], durex e até envelope nos caixas de Sedex”, denuncia Elias Divisa, presidente do sindicato dos Correios de São Paulo (Sintect-SP). No Rio Grande do Sul, há cidades onde não há sequer carteiros para fazer entregas.
Auditoria do TCU aponta maquiagem contábil
Um relatório técnico do TCU revelou que a estatal teria reduzido artificialmente seu prejuízo contábil em 2023 ao reverter uma despesa de R$ 1,032 bilhão, relacionada ao adicional de periculosidade de funcionários externos. A dívida foi registrada como simbólica — apenas R$ 18 — com base em uma liminar judicial. O ajuste fez o prejuízo declarado cair para R$ 663 milhões, mas, sem a manobra, o rombo seria de R$ 1,6 bilhão.
A auditoria classifica o procedimento como incompatível com as normas contábeis e com a própria cartilha interna da empresa. O TCU deve votar o relatório em plenário e pode obrigar os Correios a refazerem seu balanço em até 90 dias. A estatal alega que tudo foi feito dentro da lei e com respaldo jurídico.
Problemas se acumulam: voos suspensos e dívida com fundo de pensão
A crise dos Correios atinge várias frentes. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) determinou a suspensão dos voos da estatal por falhas no transporte de produtos perigosos — serviço operado por terceiros. A empresa tenta reverter a medida.
Além disso, a direção deixou de repassar duas parcelas ao fundo de previdência Postalis, somando R$ 274 milhões. O atraso na contribuição patronal gerou apreensão entre os trabalhadores, que temem impactos nas aposentadorias.
Reestruturação, demissões e férias suspensas
Para conter gastos, os Correios anunciaram um plano de reestruturação que prevê o fechamento de agências alugadas, redução do quadro de pessoal para 80 mil empregados e cortes de R$ 1,5 bilhão nas áreas administrativa e operacional. Também foi lançado um novo Plano de Demissão Voluntária (PDV).
A suspensão das férias agendadas para 2024 causou revolta e levou a Fentect (federação dos sindicatos da categoria) a recorrer à Justiça, que concedeu liminar contra a medida.
Só 15% das agências dão lucro — e a “taxação das blusinhas” piorou tudo
Segundo a própria empresa, apenas 15% das agências são superavitárias. A nova gestão, que assumiu em 2023, afirma ter investido R$ 1,6 bilhão desde então, mas culpa a “taxação das blusinhas” pela perda de faturamento.
A medida, adotada em 2024, passou a tributar compras internacionais abaixo de US$ 50 em plataformas asiáticas. Até então, os Correios eram pagos por essas empresas para entregas no Brasil. Com a mudança, elas optaram por transportadoras privadas ou passaram a montar suas próprias redes logísticas no país.
Especialista critica gestão: “Estatal tem que ser sustentável”
Para Márcio Holland, economista da FGV, a justificativa da estatal não se sustenta:
— Dinheiro não dá em árvore. A Lei das Estatais é clara: empresa pública precisa cumprir função social, mas tem que ser economicamente sustentável.