Lula mantém chefe da Abin no cargo mesmo após indiciamento pela PF por sabotagem de investigação
Decisão ocorre apesar de acusações da PF de que Luiz Fernando Corrêa atuou para travar apuração sobre espionagem ilegal durante governo Bolsonaro

Mesmo após ser indiciado pela Polícia Federal por obstrução de investigação, prevaricação e coação, o diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Luiz Fernando Corrêa, seguirá no comando da instituição. A decisão partiu do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que avaliou que o indiciamento, por si só, não justifica a sua substituição imediata.
Segundo auxiliares do Planalto, Lula determinou que o andamento do processo seja monitorado de perto, mas descartou uma mudança no comando da Abin neste momento. A decisão foi tomada após reunião com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, no Palácio da Alvorada, nesta quarta-feira (18).
Nos bastidores, interlocutores do governo revelam que o presidente enxerga o caso como uma “disputa corporativa” entre a Polícia Federal e a própria Abin, o que exigiria cautela na condução do episódio. Além disso, Lula tem uma relação antiga com Corrêa, que comandou a PF em seu segundo mandato e implantou a Força Nacional de Segurança Pública em seu primeiro governo.
Corrêa virou alvo da PF
No relatório final sobre a chamada “Abin Paralela”, a PF afirma que Corrêa tentou abafar as investigações que apuram o uso ilegal da ferramenta de espionagem FirstMile para monitorar adversários políticos do então presidente Jair Bolsonaro. O sistema teria sido usado sem autorização judicial nem controle institucional.
Segundo os investigadores, Corrêa:
- Minimizou a gravidade do escândalo do software espião;
- Protegeu servidores envolvidos, inclusive o ex-diretor de Operações de Inteligência, Paulo Maurício Pinto;
- Participou de reuniões estratégicas com alvos da investigação antes mesmo de assumir a chefia da Abin;
- Conduziu o plano de obstrução da apuração interna;
- Manteve encontro fora da agenda com Alexandre Ramagem, também indiciado;
- Ordenou movimentações suspeitas dentro da agência durante operação da PF;
- E praticou assédio moral e coação contra a ex-corregedora da Abin.
Diante dessas acusações, cresce a pressão de servidores da Abin por seu afastamento imediato. Há mobilização interna para uma greve e até a possibilidade de uma ação civil pública na Justiça.
Abin usada como braço político
As investigações revelaram que a estrutura da Abin foi usada para espionar, sem respaldo legal, ministros do STF como Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Dias Toffoli, além do presidente da Câmara, Arthur Lira, o ex-deputado Rodrigo Maia e o ex-governador de SP João Doria. A espionagem teria como base interesses políticos do entorno bolsonarista.
Um trecho do relatório aponta que a Abin também tentou comprometer o então ministro da Justiça de Lula, Flávio Dino, hoje ministro do STF, com dossiês manipulados sobre contratos assinados no Maranhão, quando ele era governador.
Mesmo com o cenário de desgaste e indícios de irregularidades, o presidente Lula preferiu não se antecipar à Procuradoria-Geral da República, que ainda vai decidir se denuncia ou não Corrêa.
Tensão nos bastidores do governo
O caso revela também uma disputa interna por protagonismo entre Corrêa e o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues. Corrêa é mais próximo do ministro da Casa Civil, Rui Costa, enquanto Rodrigues é aliado do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e da primeira-dama Janja.
O Planalto tenta conter danos e monitorar o impacto político. Mas o desgaste institucional na cúpula da inteligência do governo Lula já é visível — e tende a aumentar com o avanço das investigações.