Morre aos 88 anos o papa Francisco, o líder que desafiou tradições e reformou a Igreja

Morreu neste domingo (21), aos 88 anos, Jorge Mario Bergoglio, o papa Francisco. Primeiro pontífice latino-americano e jesuíta da história da Igreja Católica, ele faleceu em Roma, como confirmou o Vaticano. Seu corpo será velado na Basílica de São Pedro, antes da missa de corpo presente na praça homônima, em cerimônia acompanhada por fiéis do mundo todo.
Francisco havia surpreendido o mundo católico em abril de 2024, ao declarar que “tudo já estava pronto” para seu sepultamento. Ele determinou mudanças no protocolo dos funerais papais, eliminando a exposição do corpo fora do caixão. Também pediu para ser enterrado na Basílica de Santa Maria Maior, em Roma, rompendo com a tradição de sepultamento na cripta de São Pedro.
O papa dos humildes
Em 13 de março de 2013, uma frase marcou o início de um novo tempo na Igreja Católica:
“Boa noite. Vocês foram buscar o bispo de Roma quase no fim do mundo.”
Vestindo uma batina branca simples, sem adornos, Francisco se apresentou ao mundo. Escolheu seu nome em homenagem a São Francisco de Assis, santo da pobreza e dos excluídos. Foi um gesto simbólico que definiu seu papado: humildade, aproximação com os pobres e crítica às estruturas de poder.
“Como eu gostaria de uma Igreja pobre para os pobres”, disse dois dias depois, revelando que a inspiração veio do brasileiro Dom Cláudio Hummes, que no conclave lhe sussurrou: “Não se esqueça dos pobres”.
Um papa improvável
Argentino, nascido em Buenos Aires em 1936, Bergoglio era químico e entrou para a Companhia de Jesus em 1958. Tornou-se sacerdote em 1969 e foi nomeado bispo auxiliar de Buenos Aires em 1992. Chegou a arcebispo da capital argentina em 1998 e foi elevado a cardeal por João Paulo II em 2001.
Sua eleição em 2013 foi marcada por um conclave em busca de renovação após a inédita renúncia de Bento 16. Francisco foi a resposta: um nome de fora da Cúria Romana, com histórico pastoral e foco nas periferias. Na primeira viagem internacional, veio ao Brasil para a Jornada Mundial da Juventude e conquistou corações ao circular entre multidões.
Reformas e resistência
Francisco bateu de frente com setores conservadores ao propor uma Igreja menos clerical e mais sinodal. Reformou a Cúria Romana, criou o Conselho de Cardeais (C9), ampliou o papel dos leigos e nomeou mais mulheres para cargos de liderança.
Acabou com promoções automáticas no clero, tornou crimes sexuais passíveis de julgamento para todos — inclusive cardeais — e classificou a mentalidade de corte do Vaticano como “lepra”. Chegou a dizer que a Cúria era “a última corte europeia de uma monarquia absoluta”.
Um pontificado progressista
Francisco abriu caminho para mulheres e leigos participarem do Sínodo com direito a voto, autorizou bênçãos a casais homoafetivos e acolheu pessoas trans como “filhas de Deus”. Defendeu o meio ambiente com força inédita, lançou a encíclica Laudato Si’ sobre a crise climática e pediu por um mundo mais justo, dizendo que o atual modelo econômico “mata”.
As mudanças geraram forte oposição. Em 2024, setores ultraconservadores divulgaram um manifesto com críticas ao seu legado e pedidos de “reparação” no próximo conclave.
Fé em tempos sombrios
Durante a pandemia da covid-19, a imagem solitária de Francisco rezando sob chuva na Praça de São Pedro se tornou um símbolo global de fé, dor e esperança. “Todos estamos no mesmo barco, frágeis e desorientados”, disse em 27 de março de 2020, em oração que uniu milhões em silêncio.
Sua encíclica Fratelli Tutti, lançada no mesmo ano, reforçou a mensagem: “ninguém se salva sozinho”.
Últimos anos e adeus
Desde 2022, Francisco enfrentava problemas de saúde e passou a aparecer em cadeira de rodas. Em 2023, cancelou viagens por conta de bronquite e problemas pulmonares. Em fevereiro de 2025, passou por uma cirurgia “complexa” e reapareceu visivelmente debilitado.
O papa morreu como viveu: sem ostentação, fiel à simplicidade e ao compromisso com os que sofrem. Seu funeral será acompanhado por chefes de Estado, líderes religiosos e multidões comovidas. E seu legado seguirá como marco de um tempo em que a Igreja tentou voltar às suas origens.