ONG de petistas recebe R$ 640 milhões para cisternas — o maior repasse da história do programa criado por Lula
Levantamento revela rede de subcontratadas ligadas ao PT que já embolsou R$ 152 milhões; sede de uma das cooperativas é uma casa simples no interior do Ceará
DIÁRIO DO PODER

O governo Lula destinou R$ 640,1 milhões a uma única ONG comandada por filiados ao PT, por meio do programa federal de cisternas. Trata-se do maior valor já pago a uma organização desde a criação da iniciativa há 22 anos, ainda no primeiro mandato do petista.
A ONG beneficiada é a Associação Um Milhão de Cisternas para o Semiárido (P1MC), liderada por dois petistas filiados desde 1987. A contratação ocorreu em 2023, após o Ministério do Desenvolvimento Social, comandado por Wellington Dias (PT), decidir ampliar o programa com investimentos de R$ 755,8 milhões.
Embora a construção das cisternas fique a cargo de entidades subcontratadas, 37 dessas organizações também são chefiadas por petistas, e já receberam R$ 152 milhões. Algumas têm histórico de atuação em gestões anteriores do PT ou laços familiares com ocupantes de cargos públicos.
Entre os casos identificados:
- A Cootapi, do Piauí, recebeu R$ 9 milhões e é dirigida por aliados de Wellington Dias;
- No Ceará, a Comtacte foi contratada por R$ 4,6 milhões e está registrada em uma casa simples em Aracati;
- Em Pernambuco, a ONG Cecor é comandada por uma ex-assessora de deputado estadual do PT;
- Duas ONGs baianas, lideradas por ex-candidatos a vereador do partido, embolsaram R$ 6,8 milhões.
Apesar da concentração de recursos, o Ministério do Desenvolvimento Social afirma que “não considera vínculos político-partidários” no processo seletivo. Segundo a pasta, a escolha segue critérios técnicos, como experiência na área, e ocorre por meio de edital com pontuação.
A Controladoria-Geral da União (CGU) alertou para a concentração de recursos em uma única entidade e apontou falhas na execução do programa em auditorias anteriores. Em vistorias realizadas entre 2020 e 2022, 31% das cisternas apresentavam problemas como vazamentos e infiltrações. A P1MC nega responsabilidade pelas avarias.
A ONG já recebeu mais de R$ 2 bilhões do governo federal desde o início do programa. Especialistas em transparência, como Guilherme France, da Transparência Internacional, alertam que o modelo de subcontratações dificulta o rastreamento dos recursos e favorece possíveis conflitos de interesse.
“Em contratos de grande vulto como esse, é fundamental exigir programas de integridade e mecanismos efetivos de fiscalização”, afirma France.
A promessa do governo é investir R$ 1,5 bilhão no programa até 2026, para beneficiar mais de 100 mil famílias no semiárido. Mas o volume concentrado em entidades politicamente alinhadas ao Planalto levanta dúvidas sobre a imparcialidade e a fiscalização desses recursos.